Resultados dos fundos de sustentabilidade mostram que é possível expandir seus critérios para o conjunto do mercado financeiro.
O jornal Valor Econômico publicou, em 15/8, uma reportagem
mostrando o avanço dos fundos com viés voltado para os critérios de
responsabilidade social (SRI, na sigla em inglês). A matéria traz
números da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e
de Capitais (Anbima) apontando que, do início deste ano até 8 de
agosto, fundos de ações da categoria de sustentabilidade e governança
renderam 13,69%, enquanto os do Ibovespa Ativo (Ibovespa tradicional)
cresceram 5,55% e os do IBrX Ativo (fundos de ações de alta liquidez),
7,81%.
O professor Celso Leme, do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em
Administração (Coppead) da UFRJ, afirmou nessa mesma reportagem que o
desempenho citado atesta que aplicar em fundos responsáveis não é mais
um ato de fé. Há evidências de que a rentabilidade deles é pelo menos
igual à dos fundos tradicionais, se não maior, no longo prazo. Esse fato
foi demonstrado por uma pesquisa feita por um mestrando do Coppead,
Dimas Hartz Pinto, que avaliou o retorno e o risco de 11 fundos
sustentáveis brasileiros, entre janeiro de 2006 e dezembro de 2010,
abrangendo inclusive a crise de 2008.
A conclusão foi de que esses fundos ganharam por pouco das carteiras
convencionais. Isso implica dizer que, sob a ótica meramente financeira,
os fundos sustentáveis e os convencionais são iguais, rendem
praticamente o mesmo. Isto é, quem aplicou em ações socialmente
responsáveis ganhou dinheiro tanto quanto quem aplicou em papéis
tradicionais. Só que, pensando além da matemática financeira, os fundos
sustentáveis trouxeram benefícios para a sociedade, uma vez que levaram
em conta os riscos socioambientais do investimento.
E tem mais: o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da Bovespa
& BMF histórico (variação desde 30 de novembro de 2005, quando foi
criado) é de 137%, enquanto o Ibovespa tradicional somou 85,24% no mesmo
período.
Lá fora
Nos Estados Unidos e na Europa, esses fundos também tiveram desempenho destacado. O jornal britânico The Guardian
publicou recentemente uma avaliação sobre o desempenho dos bancos entre
2007 e 2010. De acordo com esse levantamento, os 29 maiores bancos
tiveram crescimento de 20% nos seus empréstimos, enquanto os bancos de
microcrédito, que negociam com a base da pirâmide, cresceram 50%.
Um indício de que os critérios socioambientais começam a ser aceitos
para avaliar riscos nos investimentos é dado pelo JP Morgan. De acordo
com reportagem do já citado The Guardian, os executivos do
banco mudaram sua percepção e passaram a compreender esses critérios
como oportunidade para o cliente. Com isso, as questões socioambientais
deixaram de ser consideradas como “mata-negócios” e passaram a abrir
novas perspectivas. Primeiro, porque essa avaliação representa uma
consultoria gratuita, apontando os pontos de melhoria do projeto ou da
empresa em relação a riscos socioambientais. Segundo, porque o crivo do
banco equivale a um selo de qualidade para o avaliado, agregando valor à
própria empresa, ao produto ou ao serviço comercializado.
PRI e critérios de sustentabildade do Banco Central
Se os fundos sustentáveis rendem o mesmo que os fundos tradicionais,
então os bancos e os gestores de ativos não só não precisam se preocupar
como também poderiam avançar com a adesão e a aplicação dos Princípios
de Investimentos Responsáveis (PRI, na sigla em inglês) para análise de
risco de todas as carteiras, fazendo com que esses princípios se
tornassem os critérios gerais do mercado financeiro.
O mesmo pode ser dito a respeito da resolução do Banco Central sobre
política socioambiental, em consulta pública, que vai ajudar a mensurar
os impactos socioambientais dos produtos e serviços ofertados e sua
adequação às demandas dos clientes e usuários.
Ao adotar esses parâmetros, os outros fundos irão precificar os
riscos socioambientais e isto terá impacto no custo do dinheiro para as
empresas de maior risco, funcionando como “desincentivo” para
determinadas atividades.
O que falta para a aplicação generalizada é a definição de um método para a valoração financeira do risco socioambiental.
Num mundo assombrado por crises econômicas e no qual as bolsas estão
caindo, a adoção dos critérios socioambientais pode representar a
sobrevivência do negócio e maior credibilidade do próprio setor
financeiro.
*Paulo Itacarambi é vice-presidente do Instituto Ethos.
Fonte: Ethos
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