Todos, no fim de
vida útil, devem ser devolvidos. Mas devolvidos a quem? Aos
comerciantes e distribuidores que os colocaram no mercado. E então?
Comerciantes e distribuidores os devolvem para fabricantes e
importadores, para que estes providenciem destinação ambiental adequada.
Essa sistemática de logística reversa está prevista na Lei nº 12.305,
de 2010, nossa Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS),
consolidando a responsabilidade ambiental pós-consumo.
Para os
segmentos de defensivos agrícolas, pneus, pilhas e baterias (de
composições específicas) e óleos lubrificantes, a logística reversa não é
novidade. Há muito esses setores têm obrigação legal, prevista em
normas federais esparsas, de dar destinação ambientalmente adequada aos
resíduos de seus produtos e/ou embalagens após uso e devolução pelo
consumidor.
Se cada Estado e o MP impor uma obrigação, as empresas não conseguirão cumprir
Para os demais
segmentos, apesar de existirem normas estaduais e municipais de
logística reversa, em sua maioria, elas não "saíram do papel".
Esse cenário
ambiental normativo é compatível com nossa Constituição Federal:
competência legislativa concorrente e interesse local. Porém, na
prática, a existência de inúmeras normas nas diferentes esferas para
regular um único comportamento do setor empresarial tem efeito
devastador: efetividade praticamente nula (no jargão jurídico: eficácia
contida ou limitada e aplicabilidade mediata e reduzida), propiciando
insegurança jurídica.
Com a publicação
da PNRS, em 2010, esperava-se que os agentes ambientais atuassem
coordenamente: Ministério do Meio Ambiente (MMA) alinharia a estrutura
da logística reversa no país conjuntamente com Estados, municípios e
Ministério Público. Ou seja, até a assinatura dos acordos setoriais, as
discussões estariam concentradas na esfera federal.
Naturalmente,
após a assinatura dos acordos, conforme previsto na PNRS e em nossa
Constituição, discussões regionais ou locais ocorreriam, mas já teríamos
diretrizes gerais e viabilidade técnico-econômica comprovada para cada
segmento. Daí em diante, especializações das tratativas via Estados,
municípios ou Ministério Público seriam razoáveis.
Afinal, se a
finalidade da PNRS é o gerenciamento ambiental adequado dos resíduos
pós-consumo, melhor seria termos norma federal eficaz regendo o sistema
de logística reversa do que milhares de ações esparsas, certo? Errado!
Hoje, a
realidade é: enquanto o setor empresarial discute a logística reversa no
Ministério do Meio Ambiente, alguns segmentos enfrentam:
(i) ação civil
pública, demandando implantação/expansão de sistema de logística reversa
e prestação de informações aos consumidores;
(ii) termo de
ajustamento de conduta para implantação/expansão de sistema de logística
reversa com obrigações que extravasam a responsabilidade compartilhada
prevista na PNRS;
(iii) termos de compromisso para implantação/expansão de sistema de logística reversa.
Ora, se cada
Estado e Promotoria decidir impor obrigação de logística reversa
específica, certamente, o setor empresarial não conseguirá cumpri-la.
Vejamos: o setor
empresarial firmaria 26 termos de compromisso estaduais, 26 termos de
ajustamento de conduta com o Ministério Público (mesmo esse não sendo o
instrumento adequado) e mais, quem sabe, por volta de 5.500 termos de
compromisso com nossos municípios? Seria este realmente o cenário
almejado pelo legislador ambiental? Será que assim caminharemos para o
desenvolvimento sustentável? Na minha opinião, não.
Se esse for o
desfecho, sairemos todos perdendo: o setor empresarial, porque estará
sujeito a penalidades por descumprimento, o governo, porque não
conseguirá implantar adequadamente a política pública ambiental de
responsabilidade pós-consumo, o Ministério Público, porque ao atuar como
fiscal da lei acabou tornando-a inócua, e, pior, a sociedade, porque o
tão almejado desenvolvimento sustentável continuará uma utopia.
Na minha
experiência diária com a questão da logística reversa em diversos
segmentos, deixo aqui uma sugestão de reflexão: que tal Estados,
municípios, MMA e Ministério Público agirem coordenadamente nas
discussões dos acordos setoriais para que nosso país estruture sistemas
de logística reversa viáveis e efetivos que propiciem a não geração,
redução, reutilização, reciclagem, tratamento, destinação de resíduos e
disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos?
Autor: Ana Luci Limonta Esteves Grizzil é
coordenadora da área ambiental do Veirano Advogados, especialista em
direito ambiental pela Faculdade de Direito e Faculdade de Saúde Pública
da USP e mestre em direito pela PUC-SPFonte: oim municipal
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