Pesquisa Akatu-Ethos 2010 mostra que fatia de consumidores conscientes permanece em 5% da população. Entretanto, houve crescimento (de 25% para 37%) do segmento mais distante do consumo consciente, o grupo chamado de “Indiferente”. Outro desafio, segundo a pesquisa, é traduzir o termo sustentabilidade para o dia-a-dia dos brasileiros – 56% dizem que nunca ouviram falar.
O Instituto Akatu e o Instituto Ethos apresentaram nesta terça-feira (14/12), em café da manhã em São Paulo, o levantamento inédito O Consumidor Brasileiro e a Sustentabilidade: Atitudes e Comportamentos frente o Consumo Consciente, Percepções e Expectativas sobre a RSE – Pesquisa 2010. Executada pela GfK Brasil, a pesquisa foi contou com o patrocínio do Bradesco, da Faber Castell, do Santander e do Walmart.
A publicação com os resultados integra a série sobre responsabilidade social e se soma à pesquisa “Práticas e Perspectivas da RSE no Brasil – 2008”, aos relatórios sobre “Percepção da RSE pelo Consumidor Brasileiro” (série de seis publicações iniciada em 2000), e aos relatórios das pesquisas Akatu nos. 3, 4, 5, 6 e 7 (a primeira realizada em 2003), todos disponíveis em www.akatu.org.br/akatu_acao/publicacoes.
A pesquisa ouviu 800 mulheres e homens, com idade igual ou superior a 16 anos, de todas as classes sociais e regiões geográficas do país, nas regiões metropolitanas de Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo, bem como em Goiânia, Manaus e noDistrito Federal.
Principais conclusões
O novo estudo traz alguns resultados positivos, como a manutenção do percentual de consumidores conscientes em 5%, o que, considerando-se o aumento populacional, significa um crescimento de cerca de 500 mil consumidores aderindo a valores e comportamentos mais sustentáveis.
Mas, ao mesmo tempo, constatou-se um crescimento (de 25% para 37% do total) do segmento de consumidores mais distante desses valores e comportamentos – o grupo chamado de “indiferente”.
De forma geral, o crescimento do segmento de consumidores “indiferentes” é creditado ao movimento de ascensão social e de incorporação no mundo do consumo de uma parte significativa da população brasileira, verificado especialmente ao longo dos dois governos do presidente Lula (2003-2006 e 2007-2010).
A renda média anual do brasileiro, que era de R$ 6.800,00 em 2000, deve chegar, segundo projeções, a R$ 17.500,00 no final de 2010. Isso representa um ganho real de cerca de 30% nesta década, descontada a inflação.
Nos últimos anos viu-se crescer a parcela da população pertencente à classe C, que atingiu 50,5% da população em 2009. Isso significa que um contingente de cerca de 29 milhões de pessoas passaram a fazer parte desse grupo, entre 2003 e 2009. Essa chamada “nova classe média brasileira” tem um perfil mais jovem, de maioria afrodescendente e com mais famílias chefiadas por mulheres. A combinação de aumento populacional e de renda fez com que essa classe C passasse a representar o segmento com o maior poder de consumo no país. E em 2010 a classe D irá se tornar o segundo segmento com maior poder de consumo, ultrapassando a classe B.
Esses fatos apresentam dois desafios: por um lado, não há ninguém que deseje que este movimento de redução da pobreza, distribuição de renda e acesso ao consumo seja interrompido. Ao contrário, que continue, amplie e carregue para a nova “classe média” os milhões de brasileiros que ainda estão abaixo da linha de acesso aos bens materiais mínimos para uma vida com dignidade e o sonho de novas conquistas. Assim, mantido esse cenário positivo, o desenvolvimento de ações de estímulo a uma sociedade sustentável deverá ser feito dentro desse contexto “desfavorável” à adoção de práticas conscientes de consumo.
O estudo revela também certa estabilidade no grupo dos “mais conscientes”, que ainda são praticamente 1 em cada 3 consumidores. Este é um grupo mais aguerrido, especialmente na internet, onde busca ativamente informações sobre RSE e sustentabilidade, e ainda é ativo em influenciar os outros. Esse grupo tem também um poder potencialmente importante para influenciar tanto empresas como outros consumidores.
Constata-se que praticamente metade da população estudada (49%) está desconectada desse debate, qualquer que seja a chave de entrada para ele – ecologia, meio ambiente, sustentabilidade ou RSE. Se forem somados a esse grupo os 11% que estão apenas interessados no tema, chega-se a 60% de baixo envolvimento com esse debate.
Além disso, 56% dos consumidores nunca ouviram falar em “sustentabilidade”. O termo desperta muito pouco interesse na população, além de ser um assunto mais abstrato e, portanto, mais difícil de ser compreendido e transformado em prática do dia a dia.
No grupo que afirma conhecer o termo “sustentabilidade”, há problemas com sua definição. Uma parcela significativa (21% dos que dizem conhecer o termo, ou 9% do total) não consegue dar nenhuma definição para ele. Outra parcela (19% do total) apresenta uma compreensão incorreta de sustentabilidade, ligada principalmente a autossustento – “ter renda para sustentar a família”, “sustentar a família” ou “se sustentar sozinho”.
Há um interesse relativamente baixo sobre responsabilidade social empresarial, quando colocada em termos simplesmente conceituais. Como decorrência desse fato, também se constata um percentual baixo de consumidores que buscam informações sobre esse tema. Do total estudado, 16% afirmam buscar informações sobre RSE. Entre estes, destacam-se consumidores universitários e os das classes A e B.
Os consumidores buscam se informar mais por internet e TV, mas a internet não desfruta ainda da mesma credibilidade da TV e dos jornais, estes pouco citados como fonte de informação sobre RSE, mas bem citados no quesito credibilidade.
Consumidores premiam empresas mais responsáveis e punem as menos responsáveis. Eles repudiam a propaganda enganosa e o tema que mais conta pontos positivos são as relações de trabalho: 80% dos consumidores apontam o desenvolvimento de alguma ação ligada à dimensão “Direito das Relações de Trabalho” como importante para que uma empresa seja considerada socialmente responsável.
Tendo em vista que os consumidores esperam e exigem que as empresas sejam socialmente responsáveis, deve-se pensar também no desenvolvimento de legislações e políticas públicas que, mesmo sem passar inicialmente pela compreensão e consciência do consumo, induzam nos consumidores e nas empresas comportamentos que gerem, como resultado, passos no sentido de uma sociedade mais sustentável.
Uma reflexão em particular merece ser desenvolvida sobre a relação das empresas com consumidores das classes C e D. Hoje é claro o foco que quase todas as empresas estão desenvolvendo no sentido de ampliar sua relação com esses segmentos, como forma de atraí-los para o consumo e ampliar seus volumes de negócio. Em que medida essas empresas buscam também, ao divulgar seus produtos e serviços, investir para desenvolver comportamentos de consumo mais consciente?
Em relação aos consumidores, alguns exemplos desse modelo, como a obrigatoriedade do uso do cinto de segurança, políticas de incentivo à solicitação de nota fiscal por meio da devolução de parcela do valor total das notas fiscais solicitadas ou a legislação de proibição de fumo em locais públicos, dão mostras de que essa estratégia pode não só provocar um comportamento mais sustentável, mas até, ao final, gerar algum nível maior de consciência no consumo dos brasileiros.
No que toca às práticas das empresas, medidas como a Política Nacional de Resíduos Sólidos, o Plano para Produção e Consumo Sustentáveis e a Política Nacional sobre Mudanças do Clima, entre outras, estão a apontar importantes mudanças no cenário regulatório-institucional. A presença ativa e articulada das empresas socialmente responsáveis nesse processo é fundamental, quer para enriquecê-lo com suas importantes experiências e reflexões, quer para evitar que, mesmo bem intencionadas, as medidas adotadas redundem em mais problemas do que soluções.
Além das políticas públicas e soluções tecnológicas e organizacionais capazes de minimizar os impactos da previsível explosão de consumo, é preciso trabalhar no redirecionamento das aspirações da sociedade como um todo. É necessário um esforço urgente e sem precedentes para dissociar “aumento contínuo do consumo” de “maior felicidade e realização”. Essa equação, que moveu (e move) o crescimento da sociedade de consumo, é incompatível com o duplo objetivo de “inclusão social com sustentabilidade”.
Para ganhar os corações, mentes e bolsos dos consumidores, a sustentabilidade, a RSE e o consumo consciente precisam ser apresentados não como conceitos sofisticados, mas traduzidos em práticas e propostas concretas. E estas não podem ser percebidas pelo público como imposições restritivas, mas sim como uma boa alternativa ao consumismo vazio, angustiante e insustentável. Como o caminho mais curto, barato e desejável rumo à felicidade, que é, ao final, o que todos almejamos.
Para acessar a íntegra da pesquisa: http://www1.ethos.org.br/EthosWeb/arquivo/0-A-b7aPesquisa_Ethos_Akatu_2010_RSE_Percepcao_Consumidor.pdf
Fonte: Instituto Akatu - Estanislau Maria - http://tinyurl.com/24matj5
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