4 de jan. de 2010

Tecnologias 'verdes' são o negócio do século 21

Há pouco mais de um ano, em novembro de 2008, depois de passar por diversas grandes companhias, a suíça Bárbara Kux ingressou na Siemens AG, gigante empresarial voltada aos setores de indústria, energia e saúde. Tinha um triplo desafio pela frente: comandar o recém-criado setor de supply chain, com volume de contratos globais estimados em ? 42 bilhões e com um sistema de compras descentralizado, assumir a área de sustentabilidade e ainda por cima ser a primeira mulher, em 160 anos de existência da empresa, a compor seu conselho de administração.

O momento era de crise econômica e ela anunciou a meta de reconstruir as relações com os 113 mil fornecedores ao redor do mundo. Além de reduzir esse número em pelo menos 20%, Kux - uma das dez mulheres mais influentes no mundo dos negócios em 2009, segundo a revista "Fortune" - viu na renegociação uma oportunidade de aprofundar a mudança de perfil da corporação em direção à sustentabilidade, iniciada em 2003, quando um estudo colocou as mudanças climáticas como megatendência planetária.

Segundo Kux, o portfólio ambiental da Siemens, o maior do mundo e já representando cerca 25% das receitas da companhia, poderia saltar para uma fatia de 40% até 2011, com a vantagem de impactar toda a cadeia de negócios. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Valor: Um estudo, encomendado em 2003, levou a Siemens a rever suas estratégias de negócios em direção ao enfrentamento das mudanças climáticas. Como a companhia vem trabalhando a aposta em um portfólio ambiental?

Barbara Kux: Nós vemos as tecnologias verdes como um negócio-chave do século 21. Quando se trata de tecnologias ambientais relacionadas à ecoeficiência, percebemos que os investimentos muitas vezes se pagam pela redução de custos que proporcionam à empresa. Em outros casos, é uma aposta que faz sentido para companhias que querem se adiantar a mudanças no ambiente regulatório ou ao aumento de custos de energia. Detectamos, particularmente, um enorme potencial de expansão para tecnologias relacionadas à eficiência energética e às mudanças climáticas. Por exemplo, para o mercado de parques eólicos e maior eficiência da transmissão de energia, a previsão é de um crescimento de 20% ao ano, enquanto que o da energia solar deve avançar 24% ao ano.

Valor: Como se dá a aposta da Siemens nas tecnologias verdes?

Kux: Quando citamos tecnologias verdes, ou um portfólio ambiental, estamos falando de produtos ecoeficientes, em especial do ponto de vista de consumo de energia. Ou de tecnologias ambientais, como os sistemas de tratamento de água, sistemas para reduzir a poluição do ar, ou ainda aqueles relacionados às fontes renováveis de energia. São três campos nos quais queremos crescer. Hoje, o portfólio ambiental da Siemens já representa 25% das receitas globais da companhia. A inovação está no cerne de nosso desenvolvimento industrial nesta área. Só em 2009, aplicamos mais de ? 1 bilhão em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) na área ambiental. Com isso, nos tornamos detentores de 14 mil patentes "verdes".

Valor: Poderia dar exemplo de alguns resultados?

Kux: Alinhamos nosso negócio a partir das megatendências que definirão o crescimento do mercado no futuro, entre as quais as mudanças climáticas e a necessidade de energia limpa. Conquistamos a liderança mundial em parques eólicos e em turbinas a vapor para centrais de energia solar térmica. Desenvolvemos o trem mais rápido do mundo, que consome apenas 0,3 litros de combustível por 100 quilômetros e de passageiros. Somos referência no estado de arte para tecnologias de purificação de água e do ar, entre tantos outros produtos e soluções nesse campo. Vemos um triplo ganho nessas tecnologias: benefícios econômicos para nossos clientes, maior qualidade de vida para a sociedade e crescimento para a Siemens.

Valor: Pouco após assumir, a senhora mencionou o desafio de tornar a Siemens líder mundial em supply chain. Prometeu rever os contratos com os fornecedores e citou o co-desenvolvimento de produtos com parceiros estratégicos. Agora, passado um ano, qual o balanço dessa estratégia?

Kux: Já tivemos um grande progresso na gestão da cadeia de abastecimento em 2009. Nossas compras centralizadas aumentaram de ? 12 para ? 16 bilhões. Um número próximo à meta de ? 17 bilhões em 2010. Também avançamos no objetivo de aumentar ampliar em 20% a 25%, no médio prazo, a participação dos produtos comprados em países emergentes. Reduzimos o número de fornecedores de 113 mil para 97 mil. Menos fornecedores significa maior eficiência, custos administrativos reduzidos e favorece uma cooperação mais estratégica para o avanço da implementação conjunta de conceitos inovadores. Queremos ter 91 mil fornecedores a médio prazo.

Valor: Como a Siemens tenta influenciar seus stakeholders - clientes, fornecedores, investidores, sociedade - para que adotem uma abordagem mais sustentável?

Kux: Esperamos que nossos parceiros vivam a ideia de sustentabilidade, para nos tornarmos mais verdes também ao longo da nossa cadeia de suprimentos. Por exemplo, introduzimos um código de conduta para nossos fornecedores do mundo todo, visando garantir que suas atividades também são sustentáveis. E estabelecemos o compromisso de reduzir nossa própria pegada de carbono. Nesse sentido, nos comprometemos a ampliar em 20% a eficiência energética de nossas plantas entre 2006 e 2011. Trocar sistemas convencionais de iluminação por outros de menor consumo, e investir na reforma de unidades de produção são duas das medidas para cumprir a meta.

Valor: E em relação aos clientes?

Kux: No ano fiscal de 2009, nossos produtos e soluções proporcionaram a redução nas emissões de cerca de 210 milhões de toneladas de CO2 equivalente a (tCO2e) para nossos clientes. É um valor próximo à soma das emissões de Londres, Nova York, Hong Kong e Berlim, durante um ano. Até 2011, queremos proporcionar a redução de 300 milhões de toneladas de CO2, equivalente, aproximadamente, ao quádruplo das emissões anuais da cidade de Nova York.

Valor: É possível saltar dos atuais 25% de receitas com o portfólio ambiental, para se tornar ser uma empresa 100% "verde"? Em caso afirmativo, quando e como?

Kux: Definitivamente nos tornaremos mais verdes. Nossa meta é ampliar a receita de nosso portfólio ambiental para ? 25 bilhões em 2011. Trata-se de uma meta conservadora, pois já chegamos a ? 23 bilhões em 2009. Há uma demanda crescente por energia e, simultaneamente, as mudanças climáticas se apresentam como um enorme desafio. A combinação desses fatores favorece a expansão do portfólio. Por outro lado, a expressão ´100% verde´ depende do sentido que se quer dar. Na Siemens, o cálculo do share do portfólio ambiental baseia-se em critérios validados por uma auditoria independente. À parte disso, tornamos obrigatórios os padrões de ecodesign em todos os nossos produtos.

Valor: A sustentabilidade é hoje um tema quente e a COP-15 atraiu mais atenções que qualquer outra conferência sobre o clima. Sob este cenário, quais as expectativas da Siemens neste campo?

Kux: A COP-15 é provavelmente a mais importante conferência da ONU em décadas. É a última chamada para o mundo tomar as medidas necessárias contra as ameaças das mudanças climáticas. Precisamos de um acordo global para garantir a redução dos gases-estufa; um mercado global de carbono; metas de redução de emissões absolutas e comparáveis, além de uma proteção efetiva da propriedade intelectual para garantir os investimentos maciços em tecnologias verdes, que são necessários. Falhar, não é opção. Mas, independentemente do resultado, a revolução nesta área já começou e a Siemens adiantou-se a ela.

Fonte: Valor Econômico (via PROCEL INFO) - 21.12.2009

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